sexta-feira, maio 16, 2025
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Dom Itacir Brassiani reflete sobre seus primeiros meses à frente da Diocese de Santa Cruz do Sul

Bispo fala sobre desafios e expectativas para a Igreja após a escolha do novo Papa

O Jornal Gazeta Popular entrevistou nesta semana Dom Itacir Brassiani, bispo diocesano de Santa Cruz do Sul, que assumiu o cargo há 8 meses, em 30 de setembro de 2024. Durante a entrevista, ele fez uma avaliação de sua trajetória à frente da Diocese e compartilhou suas experiências e desafios. Dom Itacir revelou que já teve a oportunidade de visitar algumas paróquias e conhecer parcialmente o território diocesano.

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“Posso dizer que estou muito bem na Diocese de Santa Cruz. Sinto-me acolhido fraternalmente e já me sinto em casa. No entanto, ainda tenho muito a aprender sobre a vida pastoral, e ainda não visitei todas as paróquias. Algumas delas estarei visitando em breve”, explicou o bispo.

A prioridade durante esse período inicial foi conhecer os organismos pastorais da Diocese. “Tive a oportunidade de me reunir diversas vezes com alguns setores e, com outros, em menor frequência. No entanto, sempre fiz questão de estar presente para escutar, conhecer e acolher a realidade viva e dinâmica desses grupos”, afirmou Dom Itacir.

Entre os meses de dezembro e fevereiro, o bispo dedicou-se intensamente à preparação do evento estadual da 47ª Romaria da Terra, realizada pela Diocese no município de Arroio do Meio, na terça-feira de carnaval. “Como a decisão sobre o local foi tomada de forma tardia, no final de novembro, os trabalhos se acumularam a partir de dezembro. Mas foi um evento significativo, que reuniu um grande número de fiéis e membros da Igreja do Rio Grande do Sul”, contou o bispo.

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Dom Itacir também anunciou que a Diocese iniciou a preparação para a próxima Assembleia do Plano Diocesano de Evangelização, marcada para o ano que vem. “O lançamento ocorreu esta semana de forma online. Vamos dedicar o ano todo para escutar as pessoas, os organismos e as paróquias, além de fomentar o diálogo e discernimento. Este processo culminará no próximo ano, em março, com as decisões das Reuniões Pastorais. Este ano, particularmente, será um momento importante para obter um olhar mais realista sobre a Igreja diocesana, escutando a visão das pessoas e da própria comunidade. Acredito que com isso terei uma boa oportunidade de conhecer mais profundamente a realidade da Diocese”, afirmou.

Dom Itacir também falou sobre a recente eleição do novo Papa, o cardeal Robert Francis Prevost, escolhido como o 267º papa. Com 69 anos e natural de Chicago, Prevost se tornou o primeiro papa norte-americano da história e o primeiro pontífice de um país de maioria protestante. O bispo comentou sobre a importância dessa escolha e compartilhou suas expectativas em relação ao futuro da Igreja sob a nova liderança papal.

Gazeta Popular – Na sua opinião, a escolha do cardeal Robert Francis Prevost como papa foi uma surpresa? Havia expectativas diferentes entre os membros da Igreja ou entre os fiéis? O que essa escolha representa para o futuro da Igreja?

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Dom Itacir Brassiani: Sim, pessoalmente, para mim foi uma surpresa. Na verdade, três surpresas. A primeira foi a rapidez com que ele foi escolhido. A segunda, a sua proveniência, de onde ele vem. E a terceira, o nome que ele escolheu. Eu esperava, neste momento da Igreja, um processo mais demorado, dada a pluralidade de expectativas que existem, tanto nos setores da Igreja quanto entre os fiéis. Não vou dizer que é polarização, mas há uma diversidade de expectativas e preferências diferentes. Então imaginei que levaria mais tempo.

Em segundo lugar, eu não esperava um papa da América, e menos ainda da América Latina — depois vou explicar melhor isso. Considerando os três últimos papas não italianos, pensei que a Itália cobraria uma espécie de “conta”, pois a tradição sempre deu prioridade à Itália.

E a terceira surpresa foi o nome do papa, que eu não esperava que alguém recuperasse essa dimensão do diálogo com a sociedade, com o mundo do trabalho e com as questões sociais de maneira tão expressiva e destacada como o nome escolhido por ele.

Para mim, foram três surpresas positivas. Quando digo que é o segundo papa latino-americano, é para ressaltar que ele é norte-americano de nascimento, mas filho de imigrantes europeus e latinos. Toda a sua vida pastoral e episcopal foi no sul do mundo, no Peru, de modo que ele é mais latino do que norte-americano. Portanto, é o segundo papa latino-americano consecutivo.

Além disso, a vida missionária que marcou sua trajetória certamente influenciará o caminho que ele seguirá como papa. Ele não foi bispo ou cardeal de uma arquidiocese de grande destaque mundial. Tudo isso é muito significativo e indica sinais de bastante esperança. Quando falo em esperança, não me refiro a um entusiasmo superficial, pois nenhuma pessoa, enquanto sujeito intelectual, muda a Igreja sozinha. Alguém pode conduzir processos e apontar para horizontes diferentes, mas, como o Papa Francisco mostrou, ou é um processo eclesial envolvente de toda a Igreja, ou não haverá mudanças que se sustentam.

Gazeta Popular –  Como avalia o nome que ele escolheu, Leão XIV?

Dom Itacir Brassiani – O nome Leão está relacionado a Leão XIII, que foi papa no final do século XIX, durante o auge da Revolução Industrial na Europa e também em um período intenso de migração da Europa para as Américas. Leão XIII foi quem trouxe para a Igreja e despertou o pensamento social, ou seja, o compromisso da Igreja Católica em refletir sobre as questões sociais e da sociedade, especialmente do ponto de vista dos trabalhadores. Naquela época, a jornada de trabalho era de 14 horas e o trabalho infantil era explorado de forma terrível. Foi o Papa Leão XIII quem se pronunciou sobre isso, por meio do documento chamado Rerum Novarum, que tratava das condições do mundo do trabalho. Quando ele escolheu esse nome, logo pensei que haveria essa conexão, e agora, na fala dele no domingo, ele confirmou que escolheu o nome exatamente por causa disso. Além disso, a origem dele é de Chicago, uma região marcada por uma forte vida operária, o que reforça essa ligação.

Gazeta Popular: Quais reformas o senhor acredita que são urgentes dentro da Igreja, e espera que sejam conduzidas pelo novo pontífice?

Dom Itacir Brassiani – Penso que uma primeira prioridade que deve ser colocada em prática é a superação da excessiva clericalização, da centralização, da dependência quase absoluta da Igreja em relação aos clérigos, aos padres, bispos e diáconos. Ou seja, é necessário ter uma flexibilização maior, uma abertura maior na participação dos leigos e leigas nas instâncias de decisão, nas instâncias de planejamento, nas instâncias de avaliação e também nos ministérios. Esse processo o Papa Francisco já iniciou como caminho de reflexão e eu acho que se trata de prosseguir por aí.

Segundo, um segundo caminho que poderia ser um caminho de reforma é a primazia do anúncio do Evangelho da boa notícia de uma forma que as pessoas entendam hoje. Não é uma questão só de linguagem, é de ênfase. Se eu apresento a fé cristã como um conjunto de doutrinas ou de pedras que eu posso jogar nas outras pessoas que eu não gosto, o cristianismo perde não só atração, mas perde seu DNA. Porque se olhamos para Jesus, Ele foi uma boa notícia e sempre apresentou a vontade de Deus como algo que faz bem para as pessoas, que é libertador, emancipador, que reforça a dignidade. Então, este anúncio do Evangelho como uma notícia boa para a humanidade é o segundo aspecto.

E o terceiro é continuar, como terceira prioridade de reforma, um diálogo com canais que assegurem à Igreja, de um lado, uma escuta sincera dos movimentos culturais, dos outros movimentos religiosos, das outras igrejas cristãs, uma escuta respeitosa, e um diálogo no qual seja possível também ousar apresentar a proposta católica, mas apresentar uma proposta não como a superior, a mais certa, mas como aquela que é a nossa. Porque um diálogo supõe também apresentar aquilo que é próprio nosso, se não é um diálogo que não acrescenta para os outros. A gente acolhe a perspectiva dos movimentos culturais, sociais e também das outras igrejas e religiões, mas também dialoga com aquilo que nos é próprio.

Gazeta  Popular – O Papa Francisco frequentemente destacava a importância de “construir pontes” entre as pessoas, promovendo o diálogo, a reconciliação e a paz. O senhor acredita que o novo papa seguirá esse caminho?

Dom Itacir Brassiani – Sim, acredito que sim. Isso já ficou claro no breve discurso que ele fez logo após ser apresentado ao mundo, após a eleição. Além disso, sua trajetória também aponta nessa direção. Ele sempre foi um homem de pontes: entre norte-americanos e sul-americanos, entre a cultura europeia e a cultura indígena.

Nos últimos dois anos, atuou como cardeal-prefeito da Congregação para os Bispos, o setor responsável por escolher os bispos ao redor do mundo. Para isso, precisou ser alguém que acolhe a diversidade e, ao mesmo tempo, sabe oferecer às igrejas locais lideranças adequadas às suas realidades. Portanto, tanto por sua fala inicial quanto por sua caminhada até aqui, acredito que ele será um pontífice comprometido com o diálogo e a inclusão – um verdadeiro construtor de pontes, e não de muros. Para o Brasil e para a América Latina, o fato de ele ser latino é uma experiência que certamente fará diferença.

Gazeta Popular – O senhor pretende visitar o Papa Leão em breve?

Itacir Brassiani – Sim, minha visita está marcada para o fim de setembro. Trata-se de um encontro já previsto, que reunirá entre 100 e 200 bispos recém-nomeados de diferentes partes do mundo. Durante essa semana de estudos, teremos também uma audiência particular com o Papa.

Confesso que esperava reencontrar o Papa Francisco, com quem já tive contato e que era mais próximo, especialmente por sua relação com meus colegas na Argentina. Mas agora será uma alegria conhecer o Papa Leão, nosso novo líder mundial.

MENSAGEM FINAL: Dom Itacir pede confiança no novo papa e reforça compromisso com a Diocese

Ao final da entrevista, Dom Itacir Brassiani deixou uma mensagem ao povo da Diocese e aos fiéis de Passo do Sobrado, pedindo acolhimento e confiança no novo Papa Leão, bem como em sua missão como bispo.

“Minha mensagem é: acolham esse irmão, esse pastor que chega com uma palavra importante de confirmação, de estímulo e de orientação para nossas comunidades cristãs. Quando falo em acolher com confiança, é porque vivemos tempos de polarização, em que surgem vozes espalhando medo — seja em relação ao Papa Francisco, recentemente, seja agora, em relação ao novo papa. Há quem levante suspeitas e críticas sem fundamento. Mas ele é nosso pastor. Não é um homem perfeito, claro, mas foi escolhido por um colégio de cardeais movido pelo bem da Igreja, do povo de Deus e da humanidade, e não por interesses menores.”

Dom Itacir também falou sobre sua presença na Diocese, reforçando o espírito de missão que o acompanha desde sua nomeação.

“Como já disse outras vezes, eu não fui escolhido pela Diocese, nem por vocês, leitores, nem pelos padres locais e tampouco escolhi vir. Eu fui enviado para cá. E, assim como acolho com carinho essa Igreja Diocesana e me sinto acolhido por ela, espero também ser acolhido por vocês, com meus limites e com meu grande desejo de ser uma presença fraterna, próxima e inspiradora entre vocês”, finalizou.

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