As recentes mudanças aprovadas no texto da reforma tributária, regulamentadas pela Lei Complementar 214/25, prometem transformar o cenário do agronegócio brasileiro — setor que representa cerca de 24% do PIB nacional, segundo a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) e o Cepea. Para o advogado tributarista Ranieri Genari, especialista em Direito Tributário pelo IBET e membro da Comissão de Direito Tributário da OAB/Ribeirão Preto, os avanços são relevantes, mas os desafios também exigem atenção.
Entre os principais pontos positivos destacados por Genari está a redução de 60% das alíquotas do IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) e da CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) incidentes sobre insumos agropecuários, como fertilizantes, sementes e produtos fitossanitários. “Essa desoneração deve reduzir significativamente os custos de produção rural”, afirma o especialista, que também atua como consultor tributário da Evoinc.
Outro avanço importante, segundo Genari, é o estímulo às exportações. O novo texto da reforma amplia o benefício da suspensão tributária às agroindústrias que exportarem produtos in natura no prazo de até 180 dias após a emissão da nota fiscal. “É uma forma de incentivar a cadeia exportadora e garantir maior competitividade no mercado internacional”, pontua.
A manutenção da alíquota zero para alimentos da cesta básica e a isenção de IBS e CBS para produtores com receita anual de até R$ 3,6 milhões também são considerados pontos favoráveis. No entanto, Genari alerta que, superado esse limite, os pequenos e médios produtores rurais enfrentarão o desafio de se adequar a novas obrigações fiscais, o que pode gerar aumento de custos com estrutura contábil e administrativa. “Esse será um grande obstáculo para quem ainda não possui organização tributária adequada”, ressalta.
As cooperativas também foram contempladas com previsão de crédito presumido nas aquisições feitas de associados não contribuintes, como os enquadrados no Simples Nacional. Apesar disso, Genari chama a atenção para a possibilidade de conflitos interpretativos. “A redação atual ainda pode gerar dúvida quanto à tributação das operações entre a cooperativa e o consumidor final, o que exigirá atenção redobrada.”
Outro ponto de atenção é a progressividade obrigatória do ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação), que passará a tributar heranças e doações com alíquotas crescentes conforme o valor. A medida preocupa especialmente grandes produtores rurais e herdeiros de propriedades extensas.
Genari também aponta uma questão polêmica: a incidência de IBS e CBS sobre doações com contraprestação ao doador. “Isso levanta dúvidas sobre possível bitributação, já que o mesmo fato gerador poderia ser tributado tanto pelo ITCMD quanto pelos impostos sobre o consumo”, afirma. A insegurança jurídica se agrava, segundo ele, com o fato de a Lei Complementar estabelecer que o valor pago de IBS e CBS não interfere na base de cálculo do ITCMD — situação que remete a antigas disputas sobre o ICMS na base de cálculo do PIS e da Cofins.
Por fim, Genari observa que, embora não diretamente ligado ao agronegócio, o impacto da reforma sobre o setor de serviços — um dos mais onerados pela nova sistemática — pode indiretamente afetar os custos do setor rural. “Serviços como colheita ou plantio mecanizado tendem a ficar mais caros, o que pode pressionar o preço final dos alimentos e gerar efeitos sobre a inflação.”
Apesar dos avanços, o especialista reforça a necessidade de atenção constante. “É uma reforma com pontos positivos, mas que exigirá vigilância do setor e atuação firme de entidades representativas para garantir que os ganhos não sejam neutralizados por inseguranças ou aumento de custos indiretos”, conclui.
Fonte: Ranieri Genari, advogado tributarista pelo IBET, membro da Comissão de Direito Tributário da OAB/Ribeirão Preto e consultor tributário da Evoinc.